Lord Faramir passeava frequentemente pelos seus domínios.
Atravessava a Pedraria Branca onde lhe dava prazer sentir o fresco daqueles seixos brancos, branquinhos debaixo das suas patas. Subia ao Planalto das Cebolas onde se divertia com o ondular da superfície trémula. Subia frequentemente (quando Lady Nocas não via, claro) a Serra das Cores e do Perfume. Ah! A Serra das Cores e do Perfume. Alterava-se todos os dias, mudava de cor e textura. Tinha, por vezes, pequenos apêndices onde gostava de se prender e ficar pendurado. Outras vezes era enorme com inclinações, depressões e subidas agrestes. E de tantas cores! E o perfume? Sempre o mesmo. Sempre perfeito. Com reminiscências à sua mãe.
É verdade que Lady Nocas não gostava e até se zangava quando sabia da sua estadia ali. Mas Lady Granny, mãe da sua querida preceptora, deixava-o deambular por ali. Até colocou uma mantinha no topo da Serra das Cores e do Perfume para que Lord Faramir fizesse longas sestas sentido os raios de sol que lhe aqueciam o ser.
Perto, pertinho desta Serra ficava a Estalagem Comikala. Era onde se refastelava tranquilamente em longas comezainas, confortavelmente instalado no seu pequeno trono forrado a cetim.
Lady Nocas, sempre ela, combinou com o dono da estalagem dar-lhe apenas refeições saudáveis e água cristalina, mas sempre que se fazia acompanhar por Lady Granny ou por Sir Fiodor conseguia outros pequenos prazeres. Como é que Lady Nocas descobria sempre (sempre, sempre, percebem?) que o estalajadeiro não tinha cumprido as regras era um mistério para o pequeno Lord. Mas o mal (ou o bem) já estava digerido… mas tinha que ouvir as palavras duras da zangada Lady. O pequeno Lord ficava muito quieto de olhos baixos, bem como Sir Fiodor e Lady Granny, porque o pequeno Lord já tinha aprendido que quando Lady Nocas se zangava era para ficar quieto, quietinho e ouvir. Só ouvir. Até porque também tinha aprendido que no fim aparecia um beijo muito repuxado e um sussurro doce: "Prometi a sua mãe tomar conta de si. Fazer de si um Gato valente, saudável e espadaúdo." Lord Faramir achava que lhe descobria um sorriso mas mantinha os olhos baixos.
Certo dia descobriu a Planície Branca. Que seria aquilo? Chegou-se patinha ante patinha; cuidadoso, silencioso e cauteloso. Nunca tinha visto tal coisa. Uma longa extensão branquinha e pacífica. Parou à entrada. Olhou. Levantou o pequeno focinho para tentar perceber os cheiros que emanariam daquela planície. Não lhe pareceu errado. Decidiu percorrê-la. Era suave e um pouco engraçado. Percebeu que a Planície Branca era completamente constituída por aquilo que lhe pareceu pedrinhas brancas. Cheiravam bem. Pensou que se lembrava de sua mãe lhe ter explicado alguma coisa sobre umas "certas planícies feitas de pedrinhas" e para que serviam, mas não conseguiu lembrar-se do resto. Sentiu até um pequeno calafrio percorrer-lhe o pêlo sedoso acabadinho de cardar por Lady Nocas.
- Ora vejam lá! – Pensou para si – Se um Lord majestoso como eu irei ter medo de tão pacífica Planície!
Entrou com confiança pelos domínios dos, descobriu mais tarde, Serezinhos Brancos. O Sol continuava a brilhar. A Planície resplandecia sob os seus raios e ninguém à vista. Ninguém? Mesmo? Pareceu-lhe ouvir qualquer coisa. Virou-se de repente mas não vislumbrou nada. Tudo calmo. Tudo imóvel. Estaria? Continuou. Teve certeza depois. Uma coisa, alguma coisa tinha-se mexido! Ficou atento, imóvel.
E depois aconteceu. De todo o lado, por todo o lado, os Serezinhos Brancos ergueram-se, confiantes no seu número e tomaram de assalto o pequeno Lord!
Lord Faramir combateu audazmente, lutando com este que lhe subia pelas pernas, empurrando aquele que lhe saltava para a cabeça. Mas eram tantos, por Deus, tantos! O pelo sedoso irisou-se, as unhas (nem sabia que podiam fazê-lo) saíram afiadas, bramiu-as, desferindo golpes que aniquilavam aqueles seres impiedosos, mas estes continuavam o seu ataque violento! Mas que guerra!
Conseguiria o aflito Lord escapar?
Desejou pedir ajuda, tentou gritar por socorro mas tinha já a boca tapada por aquelas criaturas abomináveis.
- Socorro! – Conseguiu dizer. Olhou para os lados da Serra das Cores e do Perfume e pareceu-lhe vislumbrar alguém. Já completamente coberto, prestes a ser provavelmente engolido pelos Serezinhos Brancos, teve a certeza de que se aproximava alguém.
- Socorro! – Mais uma vez…
Era Lady Nocas, a sua querida, corajosa salvadora. Conseguiria ela vê-lo? Saberia ela que ele ali estava, à mercê de tanto doesto?
Viu que se aproximava! Vinha salvá-lo! Já lhe ouvia os passos. Redobrou os ataques para se libertar dos imensuráveis vilões, certo que a ajuda se apropinquava.
- Lord Faramir! – Gritou Lady Nocas! – Abarbe um pouco mais!
Tempos depois, nos seus aposentos, deliciava-se com afagos da Lady enquanto lhe transmitia a aventura. Mas não a terminou. Adormeceu e sonhou. Sonhou que lhe aparecia sua mãe, Lady White, com o seu pelo branco sedoso
- Lembrai-vos, pequeno Lord, deste aviso. Das Planícies dos Serezinhos Brancos, tão aparentemente cálidas, tão enganosamente pacíficas sobrevêm inúmeros perigos. São habitados por perigosas e vis criaturas que vos tomarão de assalto se incautos forem. Dar-vos-ei o segredo para derrotar tais vilões. Aqui vos coloco (apontou para o fundo da sua barriguinhas branca) o Líquido Mágico. Ele é poderoso e, uma vez usado, deverá ser espalhado de maneira veemente por toda a planície. Ele enfeitiçá-los-á num torpor imenso.
E assim fez logo que pode.
E a Planície Branca dos Serezinhos Brancos ficou para sempre enfeitiçada e calma.
1 comment:
Bravo, bravo, bravo.
Adorei
Beijos verdes
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