Monday 3 September 2007

A propósito...

do post do Cão que morde que li hoje aqui lembrei-me de, pelo menos 3 histórias que se passaram comigo sobre estes nossos desalmados animais.

Tinha 5 anos e, de repente, deixei de falar. Não esmiuçarei as razões e/ou as causas mas a médica disse que a míuda queria era atenção.
- mimo a mais!
O pai, homem relativamente sábio puxou-me à parte e pergutou o que ela queria
- um cão
A mãe não deixou
E a miúda calou.

A psicóloga pediu para falar a sós com aquele diabrete mudo
- o que queres?
- um cão

Convencidos pelos pedidos desmesurados da miúda lá foram eles ter com um amigo da família criador de animais de caça

- Vem cá, pá! a cadela teve uma ninhada há pouco tempo e os cachorros são impecáveis.

A miúda, incapaz de se conter saltitou atrás deles para ver a mãe e os filhos.
Lindos, castanhos claros, enroscados na mãe
Pegou em todos, não se conseguia decidir
E, de repente... o clássico. Um ganido ténue, quase imperceptível.
- E aquele?
- Não é puro. É muito fraco. Não serve para nada. Está ali para morrer.
Palávras mágicas. A miúda largou todos os "belos" e correu para o moribundo. Até hoje retém os seus olhos fracos, sujos e tristes.
- É este!

O amigo-da-família-criador-de-cães-de-caça ainda tentou dissuadi-la. Mas o pai sabia.
- É este!

Passaram pelo veterinário, que lhe receitou calma pois estava fraco, desnutrido, etc, etc, etc

Foi uma demanda maravilhosa. A miúda egoísta e mimada, intempestiva, birrenta tornou-se na "mãe" do Josef.

Acordou de noite para lhe dar leitinho e limpou as "porcarias" porque a mãe tinha dito que à primeira sujidade o cão "ía para o olho da rua".

Quando o Josef ficou maiorzinho a míuda começou a dar-lhe (imaginem) a coxa do franguinho assado de sexta-feira.
-É mais tenrinha...

Crescida num bairro operário com um imenso pinhal perto, sem medos e onde todos conheciam todos, a míuda fazia todos os dias longos passeios com o Josef.

O tempo de primavera ajudava e os dois criaram uma cumplicidade que só existe de facto entre dois seres assim.

A miúda contava-lhe histórias e ele adormecia com o focinho em cima das pernas dela. Ela não se mexia para ele não acordar, mesmo depois das pernas ficarem dormentes de tanto tempo imóveis.

A miúda entrou na escola. O Josef, à semelhança do nosso herói, pedía à mãe quando chegava a hora do autocarro chegar.

A mãe abria o portão e lá ía ele esperá-la à paragem. Os vizinhos riam e as velhotas amorosas muitas vezes convidavam os dois para um bolinho caseiro.

A miúda sentava-se no quintal e o Josef aos pés dela. Imóvel.

Que longas horas e longas conversas e muitas azedas comidas, colares de malmequeres e papoilas, chás de bonecas, chapéus de palha, beijos e sestas no cimento fresquinho do quintal!!!

O Josef nunca foi um cão bonito. Tinha as pernas pequenas e até o degrau da entrada ele tinha por vezez difuldade em subir. Mas era o cão mais bonito do mundo para a miúda.

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ps - não vou contar como a miúda ficou sem o Josef e como aconteceu que o Josef se viu sem a miúda. são coisas de adulto que a miúda não conseguiu esquecer nem entender e que eu hoje também não consigo esquecer nem entender

A miúda sem o Josef ficou amargurada, febril e foi internada um fim-de-semana por princípio de desidratação. Os pais zangaram-se e ficaram sem se falar durante muito tempo
Mas seguiram em frente

O Josef morreu.

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