Pára de chorar
E dizer que nunca mais vais ser feliz
Não há ninguém a conspirar
Para fazer destinos
Negros de raiz
Pára de chorar
Não ligues a quem diz
Que há nos astros o poder
De marcar alguém
Só por prazer
Por isso pára de chorar
Carrega no batom
Abusa do verniz
Põe os pontos nos Is
Nem Deus tem o dom
De escolher quem vai ser feliz
Pára de sorrir
E exibir a tua felicidade
Só por leviandade
Se pode sorrir assim
Num estado de graça
Que até ofende quem passa
Como se não haja queda
No Universo
E a vida seja moeda
Sem reverso
Por isso pára de sorrir
Não abuses dessa hora
Ela pode atrair
O ciúme e a inveja
Tu não perdes pela demora
E a seguir tudo se evapora
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A música dá de manhã a caminho do colégio. Rotina habitual. Deixa-se a Cria Mais Velha, a Mais Nova verifica se a Cv entra no portão... cliché atirado com sorriso "um pintainho já está, falta o outro e a Mãe Galinha!"
Invariavelmente rimos os dois da piada(?) gasta. Daquelas piadas que só tem piada para nós os dois e porque é dito ali. O carro avança e a música toca. A mãe, com a voz cristalina de campainha de porta canta e a CN cala-se (já aprendeu o cachopo. não resmunga, mas ouço-lhe o grito mudo "quando é que esta coisa acaba? abre semáforo, abre para eu poder sair...")
Mas desta vez há um pedaço da letra que reclama a sua atenção.
- Mãe?
- Sim - acho que me vai pedir para me calar...
- O que quer dizer "por os pontos nos is”?
- Ah! Bem, é deixar tudo esclarecido. Por tudo em pratos limpos. Falar com os efes e os erres (por esta altura começo a rir - que se transforma na tosse cavernosa).
- Não entendo, mãe.
- Bem, imagina que me contam uma mentira a teu respeito. Eu chego ao pé de ti e digo «vamos falar, filho. Contaram-me isto e eu quero ver tudo esclarecido. Vamos conversar e por os pontos nos is.» Percebes?
- Não.
(entretanto estaciono o carro e perco ligeiramente a paciência)
- Como não percebes?
- Primeiro - espeta o dedo - os is têm sempre - enfatiza - ponto. Sempre! Se não tiverem ponto não são nada. São erros. Depois, tu nunca acreditarias numa mentira contada a meu respeito. Nunca! Tenho a certeza. Tu conheces-me. Até as minhas - novo ênfase - mentiras tu descobres, quanto mais as dos outros! E depois... pratos limpos? Que nojo! Mas há alguém que ponha as coisas em pratos sem serem limpos? ganda nodja! - mais uma expressão só nossa. Não me lembro como apareceu.
- Tudo muito bem explicadinho... ham, sem mentiras nem enganos. Tudo a descoberto. Tudo, tudo, mesmo as coisas más... tudo. Percebeste agora?
- Ah! - sorri... pensa um pouco - quem inventou essa expressão não tinha uma mãe como tu.
Fico a pensar na coisa. Ainda estou a pensar na coisa.
Um bom dia!
4 comments:
".. quem inventou essa expressão não tinha uma mãe como tu."
a sensatez desse menino consegue espantar-me .. !
;)
sensatez? ou desfaçatez? ( :) ) ainda estou para saber...
beijo constipado
Minha querida Nocas, a sua Cria não quis certamente bajulá-la e apenas disse o que pensa. Afinal, percebe-se, pelo espanto dela, que, consigo, os iii têm sempre os pontos postos e os pratos estão sempre limpos. :-)
Querida Luísa,
E sabe o quanto aprecio que as minhas Crias façam exactamente isso? Dizerem-me o que pensam! E, para o ben e para o mal, contam, sim, com todos os iis bem pontilhadinhos :)
Beijo :)
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