Friday 22 August 2008

Pedro Pedreiro

Ontem deu-me um daqueles amoques!!

Daqueles que me dão (quase) todos os dias enquanto cumpro uma rotina deliciosa...

A Rádio foi sempre uma companhia para mim. Por influência paterna, ou não, tive, desde que me lembro, grande prazer em ouvir aquela caixinha; comecei a ter rádios, vozes e programas que seguia. Em casa da Vó as crianças (eu, leia-se) só viam 1 hora de televisão. O aparelho era ligado por volta da uma da tarde para, por volta das cinco (acho eu) estar quente e ver o espaço infantil do Vasco Granja.

O resto do dia, quando não estava a tomar conta (a.k.a. brincar desmedidamente) dos animais, ouvia rádio.
“Quando o telefone toca” e “Os parodiantes de Lisboa” são marcos incontornáveis.

E lembro-me de procurar com o pai, em AM claro, estações estrangeiras para receber notícias frescas de “lá de fora”.

Não posso esquecer a minha emoção quando segui, o fecho da emissão da Rádio Cidade e da TSF, rádios muito diferentes mas, porque “piratas”, me davam uma sensação de perigo, de clandestinidade…

Em paralelo, ou consequência, não sei bem, a música tinha igual importância. Adormecer, acordar, estudar, limpar, ler… tudo acções que requeriam a presença do rádio ou da música (em cassetes e vinil, claro!).

Este preâmbulo longo para explicar a presença de um rádio/leitor em cada salita da minha humilde casa. Crias a receber esta influência, já não prescindem do rádio para adormecer, ou da escolha (sempre polémica) de um cd.

E para explicar que de manhã ouço a Rádio Comercial ou a TSF. À tarde deambulava pela M80, BestRock, TSF, Rádio Comercial ou um cdzito (isto quando tinha o meu rádio xpto. Agora fico-me pelo cdzito que a pesquisa neste é manual)…

Regresso ao início.

Ontem, impulsionada por uma música brasileira gravada no cd-salada-russa-diz-o-F-nem-acredito-que-tens-essas-músicas-todas-gravadas-no-mesmo-cd-que-vergonha, fui buscar um cd de Chico Buarque.

E ouvi esta música outra vez.
E chorei outra vez.
Não porque me sentisse triste, mas esta música faz, por falta de melhor expressão, chorar as pedras da calçada.
Expressa, de modo brilhante e simples, genial e translúcido, a inesperança. (acabo de criar esta palavra. Não é desespero, é NÃO ter esperança. Não me agradeçam… apenas serviço público deste lado. Agora a sério…) Aqui vos deixo a letra…

Pedro pedreiro penseiro esperando o trem
Manhã parece, carece de esperar também
Para o bem de quem tem bem
De quem não tem vintém

Pedro pedreiro fica assim pensando
Assim pensando, tudo passa
E a gente vai ficando pra trás
Esperando, esperando, esperando
Esperando o sol
Esperando o trem
Esperando o aumento
Desde o ano passado para o mês que vem

Pedro pedreiro penseiro esperando o trem
Manhã parece, carece de esperar também
Para o bem de quem tem bem
De quem não tem vintém

Pedro pedreiro espera o carnaval
E a sorte grande do bilhete pela federal
Todo mês
Esperando, esperando, esperando
Esperando o sol
Esperando o trem
Esperando o aumento para o mês que vem

Esperando a festa
Esperando a sorte
A mulher de Pedro
Está esperando um filho
Pra esperar também

Pedro pedreiro penseiro esperando o trem
Manhã parece, carece de esperar também
Para o bem de quem tem bem
De quem não tem vintém

Pedro pedreiro está esperando a morte
Ou esperando o dia de voltar pro norte
Pedro não sabe, mas talvez no fundo
Espere alguma coisa mais linda que o mundo

Maior que o mar
Mas pra que sonhar
Sei lá, no desespero de esperar demais
Pedro pedreiro quer voltar atrás
Quer ser pedreiro pobre nada mais
Sem ficar esperando, esperando, esperando
Esperando o sol
Esperando o trem
Esperando o aumento para o mês que vem
Esperando um filho pra esperar também
Esperando a festa
Esperando a sorte
Esperando a morte
Esperando o norte
Esperando o dia de esperar ninguém
Esperando enfim nada mais além
Que a esperança aflita, bendita, infinita
Do apito do trem
Pedro pedreiro pedreiro esperando
Pedro pedreiro pedreiro esperando
Pedro pedreiro pedreiro esperando o trem

Que já vem
Que já vem
Que já vem...

__________________________________
PS
Parabéns Nelson Évora!!!!!!!!

2 comments:

Luísa A. said...

Pedro pedreiro... Nelson Évora... Ou de como a vida tem sempre várias perspectivas por que pode ser observada. Não esquecendo, Nocas, que o Nelson ou o Obikwelu já foram «Pedro».

nocas verde said...

Luísa,

Correcto, como sempre.
Os vários lados... deste lado

obrigada