Friday 17 April 2009

Olhos Castanhos - O Tó

Era a única fruta a que não resistia. Saltava os muros, rastejava por baixo dos portões e apanhava os mais redondos e vermelhos.

Soube mais tarde que se chamavam tomates e que não eram considerados frutos mas continuaram a ser o seu fruto favorito.

Gostava deles maduros. Trincava-os e depois sugava o sumo delicioso sem perder uma única gota.

Na casa do Senhor havia frutos exóticos enviados das terras do ultramar com cores vivas e cheiros intensos mas ela continuava a escolher o tomate.

Quando conseguiu ter uma casa e um espacinho de terra palmilhou-o todo, cuidadosamente, de manhã, à tarde e à noite. Viu onde batia mais o Sol, onde estava mais sombra, onde o vento não chegava. Escolheu um cantinho logo à direita da escada que lhe serviria de solar, onde embalaria os filhos, onde passaria muitas e longas tardes fazendo costura, crochet ou simplesmente acariciando um gato. Iria ter um gato, decidiu.

Pegou no tomate e comeu-o com ar cerimonioso. Retirou as sementes e colocou-as no cantinho de terra escolhido.

Cresce, meu menino. Cresce. – sussurrou.

Ao lado colocou o tanque novinho em folha, de costas para o portão, para as vizinhas ao passarem não vissem a roupa que lavasse. Acreditava que a roupa com mau olhado era muito perigoso e as roupas belas dos doutores que lavava era muito preciosa.

Plantou também salsa, coentros, couve, nabos, morangos e outras coisas, tudo à volta do limoeiro que já lá estava, tudo do lado direito.

Do lado esquerdo construiu um pequeno galinheiro.

O gato encontrou-o na rua, abandonado e sujo. Levou-o para casa, deu-lhe banho com muito sabão azul e branco. O que é bom para a roupa das senhoras é bom para ti… Chico. Já nessa noite o Chico dormiu aos pés da cama, por cima do raminho de eucalipto queimado colocado debaixo do colchão, para protecção da casa.

O Tó cresceu. Deu tomates, primeiro pequenos, depois grandes, carnudos e suculentos. Deu tomates durante muitos anos.
O Chico e o Tó foram companheiros fiéis.
Os seus companheiros.

13 comments:

drengo said...

honedis

Chico & To - a good bunch of mateseu dou as trutas e as frutas (tenho um viveiro de trutas na cave - onde era o poço do elevador...), e troco pelos legumes e companhia do (ti) Chico

a "honedistade" é uma honestidade disléxica.

drengo said...

bunch of mates - e com amizade que cola: entre eles, e às letras que deles falam

submat - é a carpete que tenho na sub-cave.

nocas verde said...

Olhe que boa utilização para o poço do elevador!
os vizinhos fazem exercício logo ficam mais magros
poupa-se energia logo o ambiente fica mais saudável
o comdomínio fica mais barato logo recupera-se a ecónomia
elogia o caríssimo Drengo logo fica a nv encabulada (e muito agradecida)
Até ao fim do dia coloco (mais) estas brilhantes contribuições para o WF que agora se porta muito bem no seu lado!
beijinho

Patti said...

Que nostalgia, Nocas.
Tive tantos companheiros desses na casa dos meus avós...

Adorei, bom fim-de-semana.

nocas verde said...

Querida Patti,
Obrigada
(imodestamente convido-te a leres o resto desta "nostalgia em andamento"... no tag "olhos castanhos)
Um beijinho e bom fim-de-semana também :)

Gi said...

Nunca tive uma vida destas, verdadeiramente campesina; muitas vezes tenho pena.

nocas verde said...

Querida Gi,
uma vida campesina mesmo, mesmo às portas da cidade... os tempos é que eram outros
Obrigada pela visita
sempre bem-vinda por aqui :)

drengo said...

venho aqui ler os comentários, e apanho aqui com um colorth que me faz pensar em dentes coloridos - ou o daffy duck... talkingth abouth theth colorths of your backyardth... (desculpe os perdigotos...)

tive vida campesina loooonge da cidade. não aconselho água-pé acompanhando sandes de presunto caseiro em barras de broa de azeite, no intervalo da tarde, quando fugíamos até à sombra antes de voltar a pegar na enxada e ir controlar os valados de forma a regar, um de cada vez, os talhões do que houvesse: feijão, batata, milho, tomates, cenouras...

água-pé aos nove anos... deu nisto, COLORteeTH...

e tomates? só se estivessem pouco maduros, e carregadinhos de sal grosso.. miam, miam..

nocas verde said...

água-pé aos nove anos?... Precoce,não?
barras de broa
presunto
azeite

e a malta de dieta forçada :(
quanto ao resto... está bem, está bem. assim que voltar do almoço coloco os seus wf em postal. e que eles emrecem!

já me ri (o que no meio do testamento mórbido que redijo não é muito aconselhável, ups!)

CPrice said...

.. ternura. Já percebi de onde te veio o dote para a salada ;)

Beijinho *

nocas verde said...

(shiiiiu. assim ainda acabas com a minha fama depéssima cozinheira)

ou estás a chamar-me louca - os únicos a saberem fazer saladas?

ou...
hum
:)
kiss

CPrice said...

.. isso

ehhehe

nocas verde said...

ah, pronto! estou mais descansadita :)